sexta-feira, 19 de novembro de 2010

A economia do lixo

Os imparáveis Free Range Studios ("criatividade com consciência") lançaram mais um vídeo da colecção The Story of Stuff: The Story of Electronics.


É muito verdade que os produtos e preços estão feitos para durar pouco e serem deitados fora e substituídos pelo último lançamento... E também que o preço de tantos produtos electrónicos é tão baixo que muita gente pensa facilmente em comprar só porque pode comprar. Há 20 anos comprar um computador era um acontecimento especial, um forte investimento muito ponderado e só realizado quando "mesmo necessário" (seja isso o que for). O computador em que escrevo custou pouco mais de 250 Euros há 2 anos. Gostaria que ele durasse muitos anos, pois funciona bem e faz o que preciso. Mas estou consciente de que um pequeno percalço no funcionamento, uma peça que deixe de funcionar, facilmente tornará mais barato comprar um novo do que reparar este. É muito difícil não entrar no jogo.

Como é que um computador pode ser tão barato? Como a Annie Leonard (a rapariga no vídeo) comenta, muito provavelmente devido às externalidades negativas que não estão precificadas. Ao pagar pelo produto não estamos a pagar pela poluição causada, pelos direitos humanos desrespeitados, pelos estragos na saúde de quem contacta com produtos tóxicos na produção, transporte, utilização, reciclagem ou decomposição do produto...


Responsabilidade

E que tenho eu a ver com tudo isto? Se as coisas são baratas então toca a aproveitar! Como já comentado nas bulicenas: O meu consumo é o motor de uma cadeia montada para satisfazer as minhas “necessidades”. Cada compra é um voto a favor dessa cadeia e de tudo o que a envolve. Cada compra representa a minha assinatura, em papel azul de 25 linhas e reconhecida em cartório, aprovando tudo o que se passa ao longo da cadeia produtiva. Será que consigo ficar de consciência tranquila com as aprovações que faço todos os dias?

A Annie propõe que os fabricantes de electrónicos sejam responsabilizados pelo ciclo de vida completo dos aparelhos que vendem. Ou seja, quando se tornam obsoletos, os aparelhos deveriam ser devolvidos à origem, para eles tratarem da reutilização, reciclagem, o que seja. Isto incentivaria as marcas e fabricantes (hoje em dia raramente são a mesma entidade: a Apple*, por exemplo, que eu saiba não fabrica nada - desenha e mandar produzir os seus produtos em algum lugar barato, tipicamente na Ásia, e depois gasta brutalidades em marketing para nos convencer de que estamos mesmo a precisar do novo iCoisa) a optimizarem os seus produtos para talvez durarem mais, serem mais reutilizáveis, mais recicláveis, possivelmente mais compatíveis uns com os outros... E naturalmente tornaria os produtos mais caros (porque as tais externalidades seriam internalizadas - o preço incluiria uma maior quantidade de efeitos no mundo), e portanto nós compraríamos menos e haveria menos lixo a circular no mundo.

Num texto do blog Transforming Cultures do Worldwatch Institute o autor sugere que comecemos já a responsabilizar os CEOs/presidentes das empresas a quem compramos os nossos electrónicos. Ele até publica as (segundo ele verdadeiras) moradas do Steve Jobs (da Apple) e do Michael Dell (da Dell) para podermos começar a enviar-lhes o nosso lixo electrónico. Na prática não é uma ideia tão boa para quem não é vizinho dos senhores, devido aos custos e à poluição originada pela circulação dos produtos à volta do mundo. Mas por que não começar mais perto de casa, por exemplo devolvendo os produtos aos revendedores autorizados dos nossos produtos? Idealmente, à loja em que comprámos o produto. Isso já é mais fácil e mais prático. Se toda a gente fizesse isso, talvez esses revendedores, depois de tentarem durante algum tempo desfazer-se dos produtos à socapa, na calada da noite, em algum ermo longe da loja, começassem a pensar que tinham de encontrar uma solução melhor (antes de serem presos ou morrerem soterrados em lixo electrónico).

E a minha responsabilidade? Outra iniciativa bastante simples e totalmente sob o nosso controlo é não comprar, ou adiar novas compras o máximo "possível" (claro, fica ao critério de cada um o que é "possível"). A minha câmara fotográfica tem só 1 ano, o meu computador 2, o telemóvel 4...



Conseguirei chegar a 10 anos com algum destes aparelhos? Confesso que soa quase impossível... Não tanto por achar que vou sentir "necessidade" de melhores máquinas (excepto talvez o computador, já que os produtores de software colaboram ativa e vergonhosamente com os de hardware, para tornarem os programas cada vez menos eficientes e exigentes de processadores mais rápidos, discos e memórias maiores, etc.), mas porque suspeito que elas simplesmente vão deixar de funcionar em algum momento e comprar uma nova vai parecer a melhor solução.

Hmmm... E será que não estou mesmo a precisar de um leitor de mp3, um telemóvel com acesso Internet, um leitor de ebooks, um GPS, uma TV, uma consola de jogos, .....?


Histórias de outras cenas

Na coleção "história das cenas" existem outros excelentes vídeos sobre:
- Cosméticos - o uso de substâncias tóxicas em produtos que usamos no dia-a-dia
- Água engarrafada - a "procura manufacturada" (i.e., estimulada pelos fabricantes, neste caso de água engarrafada) que nos leva a comprar coisas de que não precisamos e que poluem o mundo
- O comércio de emissões de carbono e seus problemas (segundo um amigo meu especialista no assunto, existem sérias falhas nos argumentos, apontadas neste artigo)


Histórias de cenas para miúdos

Na mesma onda da "história das cenas", miúdos e graúdos podem tirar proveito dos vídeos (de 2 minutos cada - bem adequados à capacidade limitada de manter a concentração, epidémica hoje em dia) "Loop Scoops" ("vídeos para fazer-nos pensar nas cenas na nossa vida"). Gostei muito deste sobre a Loja da Felicidade:


E tu? Que ideias sugeres para sairmos da economia do lixo e começarmos a economizar lixo?


*Para os fãs e consumidores actuais ou potenciais da Apple: a empresa publica "relatórios ambientais" sobre cada um dos seus produtos. Por exemplo, aqui encontra-se o do famoso iPad. Claro, muitas mensagens positivas. Não faço ideia se os produtos são bons ou maus, melhores ou piores que os concorrentes. A credibilidade de um sistema de avaliação ambiental obviamente não será muito elevada se os autores forem as próprias marcas ou fabricantes dos produtos avaliados. Alguém conhece alguma entidade razoavelmente independente que faça este tipo de análises?

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Estado do ensino, flash mobs e lip dubs

Descobri (obrigado, Miguel) que o Técnico já não é o que era!



Está muito melhor!! Especialmente as praxes (foi uma iniciativa de boas-vindas aos novos alunos!), a que nunca achei piada nenhuma na sua versão (tradicional?) de vingança nos caloiros deste ano pela vingança dos veteranos inflingida aos caloiros do ano anterior, pela vingança de dois anos antes... etc. etc.


Flash Mobs

O vídeo enquadra-se no conceito de flash mob: reunião de um grupo de pessoas em local público para uma actividade surpreendente num curto intervalo de tempo.

Ouvi falar pela primeira vez do conceito há uns 4 anos, a propósito do flash mob organizado por Improv Everywhere (que se define como "Improv Everywhere causes scenes of chaos and joy in public places") numa loja Best Buy em Manhattan, em que um monte de gente compareceu vestindo roupa semelhante à dos funcionários da loja. Na altura achei a ideia espectacular, de certa forma hilariante. Mas também fiquei a pensar nas questões éticas, devido às externalidades implicadas, ao impacto nas outras pessoas. O que terão achado desta iniciativa os funcionários e os verdadeiros clientes da Best Buy? Alguns terão achado piada, outros possivelmente não (especialmente os que decidiram chamar a polícia). A Best Buy, feitas as contas, deve ter apreciado a publicidade gratuita. Mas acredito que seja muito fácil, na miopia encandeada pelo efeito de manada, ter comportamentos que individualmente, em tranquilidade e com a cabeça limpa, não nos pareceriam correctos.

Ainda mais assustador é pensar o que poderá fazer de mal alguém que consiga influenciar tão poderosamente um grupo grande de pessoas. Mas como seria bom que essa pessoa existisse e além de bem intencionada fosse inteligente e capaz de tomar boas decisões (o famoso e utópico ditador benevolente e esclarecido?) e coordenar massas de gente para alcançar objectivos positivos? Eu votaria nessa pessoa para presidente do mundo!


Lip Dubs

E descobri que não é só o Técnico que tem iniciativas criativas e empreendedoras. Este vídeo do ISCTE (obrigado, Ana!) é espectacular. Não só é animado e divertido por si só, como admirável pela organização necessária e qualidade da execução (esta notícia dá uma ideia do processo).



Certamente vozes críticas dirão que este pessoal deveria mas era estar todo a estudar! Tendo passado os meus 5 anos no Técnico ocupado com bastantes coisas além dos estudos, não poderia discordar mais. Olhando para trás, está claríssimo que o que fiz antes e depois das aulas e estudos foi tão ou mais importante para me tornar quem sou. Especialmente os projectos empreendedores na Associação Juvenil de Ciência (em particular a CiênciaJ) e a prática disciplinada e intensa do pentatlo moderno. E sou muito feliz, obrigado! :)

Este vídeo é um lip dub: um vídeo filmado de uma vez só, sem cortes (pelo menos acho que isto faz parte da definição do conceito), com os participantes coordenados por um som gravado (por exemplo, uma canção) que é sobreposto ao som real na edição final do vídeo. E em particular é um University Lip Dub.

Outro exemplo muito recente de um lip dub é este pela independência da Catalunha (recordista mundial em número de participantes). Concordo que está muito animado e espectacularmente realizado, apesar de não me identificar com a mensagem politicamente nacionalista (mas acho muito bem o nacionalismo cultural - a promoção dos próprios valores, características, rituais e tradições - sem desprezo pelos dos demais, nem opressão ou outros impactos negativos).

Divirtam-se!