Os imparáveis Free Range Studios ("criatividade com consciência") lançaram mais um vídeo da colecção The Story of Stuff: The Story of Electronics.
É muito verdade que os produtos e preços estão feitos para durar pouco e serem deitados fora e substituídos pelo último lançamento... E também que o preço de tantos produtos electrónicos é tão baixo que muita gente pensa facilmente em comprar só porque pode comprar. Há 20 anos comprar um computador era um acontecimento especial, um forte investimento muito ponderado e só realizado quando "mesmo necessário" (seja isso o que for). O computador em que escrevo custou pouco mais de 250 Euros há 2 anos. Gostaria que ele durasse muitos anos, pois funciona bem e faz o que preciso. Mas estou consciente de que um pequeno percalço no funcionamento, uma peça que deixe de funcionar, facilmente tornará mais barato comprar um novo do que reparar este. É muito difícil não entrar no jogo.
Como é que um computador pode ser tão barato? Como a Annie Leonard (a rapariga no vídeo) comenta, muito provavelmente devido às externalidades negativas que não estão precificadas. Ao pagar pelo produto não estamos a pagar pela poluição causada, pelos direitos humanos desrespeitados, pelos estragos na saúde de quem contacta com produtos tóxicos na produção, transporte, utilização, reciclagem ou decomposição do produto...
Responsabilidade
E que tenho eu a ver com tudo isto? Se as coisas são baratas então toca a aproveitar! Como já comentado nas bulicenas: O meu consumo é o motor de uma cadeia montada para satisfazer as minhas “necessidades”. Cada compra é um voto a favor dessa cadeia e de tudo o que a envolve. Cada compra representa a minha assinatura, em papel azul de 25 linhas e reconhecida em cartório, aprovando tudo o que se passa ao longo da cadeia produtiva. Será que consigo ficar de consciência tranquila com as aprovações que faço todos os dias?
A Annie propõe que os fabricantes de electrónicos sejam responsabilizados pelo ciclo de vida completo dos aparelhos que vendem. Ou seja, quando se tornam obsoletos, os aparelhos deveriam ser devolvidos à origem, para eles tratarem da reutilização, reciclagem, o que seja. Isto incentivaria as marcas e fabricantes (hoje em dia raramente são a mesma entidade: a Apple*, por exemplo, que eu saiba não fabrica nada - desenha e mandar produzir os seus produtos em algum lugar barato, tipicamente na Ásia, e depois gasta brutalidades em marketing para nos convencer de que estamos mesmo a precisar do novo iCoisa) a optimizarem os seus produtos para talvez durarem mais, serem mais reutilizáveis, mais recicláveis, possivelmente mais compatíveis uns com os outros... E naturalmente tornaria os produtos mais caros (porque as tais externalidades seriam internalizadas - o preço incluiria uma maior quantidade de efeitos no mundo), e portanto nós compraríamos menos e haveria menos lixo a circular no mundo.
Num texto do blog Transforming Cultures do Worldwatch Institute o autor sugere que comecemos já a responsabilizar os CEOs/presidentes das empresas a quem compramos os nossos electrónicos. Ele até publica as (segundo ele verdadeiras) moradas do Steve Jobs (da Apple) e do Michael Dell (da Dell) para podermos começar a enviar-lhes o nosso lixo electrónico. Na prática não é uma ideia tão boa para quem não é vizinho dos senhores, devido aos custos e à poluição originada pela circulação dos produtos à volta do mundo. Mas por que não começar mais perto de casa, por exemplo devolvendo os produtos aos revendedores autorizados dos nossos produtos? Idealmente, à loja em que comprámos o produto. Isso já é mais fácil e mais prático. Se toda a gente fizesse isso, talvez esses revendedores, depois de tentarem durante algum tempo desfazer-se dos produtos à socapa, na calada da noite, em algum ermo longe da loja, começassem a pensar que tinham de encontrar uma solução melhor (antes de serem presos ou morrerem soterrados em lixo electrónico).
E a minha responsabilidade? Outra iniciativa bastante simples e totalmente sob o nosso controlo é não comprar, ou adiar novas compras o máximo "possível" (claro, fica ao critério de cada um o que é "possível"). A minha câmara fotográfica tem só 1 ano, o meu computador 2, o telemóvel 4...
Conseguirei chegar a 10 anos com algum destes aparelhos? Confesso que soa quase impossível... Não tanto por achar que vou sentir "necessidade" de melhores máquinas (excepto talvez o computador, já que os produtores de software colaboram ativa e vergonhosamente com os de hardware, para tornarem os programas cada vez menos eficientes e exigentes de processadores mais rápidos, discos e memórias maiores, etc.), mas porque suspeito que elas simplesmente vão deixar de funcionar em algum momento e comprar uma nova vai parecer a melhor solução.
Hmmm... E será que não estou mesmo a precisar de um leitor de mp3, um telemóvel com acesso Internet, um leitor de ebooks, um GPS, uma TV, uma consola de jogos, .....?
Histórias de outras cenas
Na coleção "história das cenas" existem outros excelentes vídeos sobre:
- Cosméticos - o uso de substâncias tóxicas em produtos que usamos no dia-a-dia
- Água engarrafada - a "procura manufacturada" (i.e., estimulada pelos fabricantes, neste caso de água engarrafada) que nos leva a comprar coisas de que não precisamos e que poluem o mundo
- O comércio de emissões de carbono e seus problemas (segundo um amigo meu especialista no assunto, existem sérias falhas nos argumentos, apontadas neste artigo)
Histórias de cenas para miúdos
Na mesma onda da "história das cenas", miúdos e graúdos podem tirar proveito dos vídeos (de 2 minutos cada - bem adequados à capacidade limitada de manter a concentração, epidémica hoje em dia) "Loop Scoops" ("vídeos para fazer-nos pensar nas cenas na nossa vida"). Gostei muito deste sobre a Loja da Felicidade:
E tu? Que ideias sugeres para sairmos da economia do lixo e começarmos a economizar lixo?
*Para os fãs e consumidores actuais ou potenciais da Apple: a empresa publica "relatórios ambientais" sobre cada um dos seus produtos. Por exemplo, aqui encontra-se o do famoso iPad. Claro, muitas mensagens positivas. Não faço ideia se os produtos são bons ou maus, melhores ou piores que os concorrentes. A credibilidade de um sistema de avaliação ambiental obviamente não será muito elevada se os autores forem as próprias marcas ou fabricantes dos produtos avaliados. Alguém conhece alguma entidade razoavelmente independente que faça este tipo de análises?
olha primo.
ResponderExcluirnão sei o que te diga acerca de tudo isto...
eu acho que existe um sistema que força a sociedade de consumo (pela generalizada falta de opções) a consumir de acordo com as regras vigentes.
mas também sei que o consumidor tem a culpa.
estes vídeos são, como quase tudo na vida, uma faca de dois gumes.
Por um lado consciencializam, alertam, esclarecem.
Por outro lado apontam o dedo à indústria, definindo rápida e comodamente um bode expiatório.
A consciência tem que ser interna, derivar do interior de cada um de nós. de outra forma este vídeo é só mais um produto de consumo rápido da sociedade moderna.
Tão depressa nos desperta a atenção como a seguir perde o interesse.
Sinceramente é o que eu penso da maior parte da "sensibilização" que se faz.
É preciso sensibilizar menos e agir mais.
Paulo Fonseca
A Nokia mudou de ponteira de carregador á coisa de uns 2 anos (+-)
ResponderExcluirOs meus cães eram especialistas em roer "electronix" e os carregadores acumulados por uma inteira família em anos de consumo de telemóveis não chegaram a ser úteis, quando o poderiam ter sido.
Alguém me explica os benefícios das novas fichas?
é o beneficio do consumo. claro
Paulo Fonseca
Quando ero un bambino a genta sabia que a tinta tinha acabado quando na ultima folha já não se conseguia ler nada...
ResponderExcluirGeralmente começava a falhar e a gente ainda sacava uma quantas a queimar os últimos cartuxos.
Fiquei surpreendido quando um dia vi uma folha a passar de super qualidade para 0 tinta na mesma folha. fiquei parvo com tanto avanço tecnológico que permitia ter um tão bom uso da tinta.
Uma vez, e ainda impressionado com estes avanços tecnológicos, quando reformei uma impressora por outra nova, quis ser um gajo porreiro-econo-ecolo e comprei uma impressora com tinteiros de cor individuais (4 cores), para não ter que deitar fora um tinteiro de cor só porque uma das tintas acabou.
O avançado software de gestão que vem com a impressora (e também argumento de venda) faz o update do chip de nivel do tinteiro. Assim o chip, ao fim de alguns quilómetros fecha a torneira.
curiosamente os 3 tinteiros acabaram todos ao mesmo tempo, g'anda coincidência pá.
abanei o tinteiro e ouvia ainda tinta a chocalhar lá dentro.
observei, vi um autocolante onde se lia: ATENÇÃO, PERIGO - NÃO RETIRAR
Achei que aquilo era mais um convite provocatório que uma verdadeira proibição...
como designer que sou aceitei o desafio e "explorei" o tinteiro.
abri e VI, dois compartimentos separados de tinta.
Por baixo do autocolante estava uma borracha/plástico que, quando puncionada rompia a separação entre os reservatórios de tinta permitindo a reserva passar ao reservatório principal.
A única coisa que o revendedor precisa quando recebe um tinteiro para reciclar é do seu kit amigo do ambiente:
Um equipamento electrónico que faz reset da contagem do chip existente .
Uma agulha para furar o reservatório da reserva.
Um autocolante a dizer PERIGO - ALTAMENTE PREJUDICIAL PARA A SAÚDE para manter abelhudos como eu fora dos meandros do obscuro negócio dos tinteiros usados.
Quando damos um tintiro para reciclar estamos a fornecer de forma gratuita para revenda um artigo que já pagámos por inteiro da primeira vez.
Faz lembrar a quermesse da festa em honra de Nossa Senhora lá do sítio, mas ai o donativo é esclarecido, voluntário no fim só joga ás rifas quem quer.
agora vão lá todos a correr reciclar os vossos tinteiros que a epson, a canon, a HP e essas todas agradecem.
Há muita mentira neste mundo primo.
Queres mudar o mundo reduz o consumo, reorienta o teu consumo.
Paulo Fonseca
Para não falar do markting que fazem de que o produto que eles vende é que está conforme e é que é produzido segundo as regras correctas de respeito pelo ambiente.
ResponderExcluirdepois criam linhas brancas para repescar o mercado e vender o excedente de produção e alcançar mercados mais baixos.
O ambiente é mais um nicho de mercado como todos os outros. e há muita gente a aproveitar-se disso.
O Jorge Palma diz e é verdade, se bem que a musica é noutro contexto:
ResponderExcluirtodos náo pagamos por tudo o que usamos
o sistema é antigo e não poupa ninguém
somos todos escravos do que precisamos
reduz as necessidades se queres passar bem
que a dependência é uma besta
que dá cabo do desejo
a liberdade é uma maluca
que sabe quanto vale um beijo
passa bem primo, e consome pelo que tu acreditas ser o mais correcto.
Abraço
Paulo Fonseca
Ola',
ResponderExcluirUse - Reuse - Recicle
Nao consumir so' por consumir, nao confundir necessidades com luxos e quando nao precisamos mais de um bem dar-lhe um destino util, por exemplo oferecendo no Freecycle.
Quando precisamos de alguma coisa antes de seguirmos a linha normal e ir a correr comprar, ver se alguem tem um para reciclar gratuitamente no freecycle ou comprar em segunda mao em leiloes como o e-bay, para nao gerarmos mais lixo que o necessario.
Comida, comprar so' o que tencionamos comer.
Aqui no Reino Unido 1/3 da comida comprada acaba no lixo, e' um desperdicio enorme.
Eu tenho lido muito e apesar de ser ainda uma consumista estou a fazer um caminho muito mais saudavel para melhorar a pegada de carbono e lixo da minha familia.
E' possivel, e' engracado, e' muito mais saudavel e e' melhor para a carteira.
Gostei muito deste post.
Beijinhos
Tou contigo páh! tenho um charuto de um computador de torre que faz um barulho tipo aspirador e ainda não me rendi a comprar um novo com 10x mais capacidade por poucos euros....
ResponderExcluirAbraço!
J.Feijoo
ah nuno, já não te lia há alguns tempos e estava com saudades :-). acho a série "story of stuff" muito gira, até porque sempre dá idéias práticas do que se pode fazer para amelhorar a situacão.
ResponderExcluirforça com este espírito optimista, let's be the change we want to see in the world :-).
beijinhos!