sábado, 20 de fevereiro de 2010

Sou emigra

Sou um emigra de visita à terrinha quando...
  • fico emocionado sempre que passo por cima de Lisboa antes de aterrar

  • gosto de ver que o país está muito cosmopolita, com abundância de sotaques, outras línguas, cores e feições diversas

  • me irrita o xenofobismo e os nacionalismos egoístas

  • preciso pensar para ter a certeza de quem é o presidente da república

  • ninguém fala bem do primeiro-ministro... mas ele foi eleito há poucos meses

  • não reconheço ninguém na capa das revistas "sociais"

  • não conheço nenhum jogador ou treinador de futebol, e presidente só o Pinto da Costa (ainda é ele, certo??)

  • penso que ainda existem os "três grandes" no futebol nacional

  • parece que os Xutos celebram cada ano mais 5 anos de existência

  • fico a saber que os Delfins vão acabar

  • reparo que o Fadigas (baixista dos Delfins) está a ficar gordo e careca

  • não acredito que o julgamento da Casa Pia ainda não acabou

  • percebo com tristeza que a corrupção está booming em Portugal

  • observo que a "indústria bancária" também está booming: encontram-se quase tantas agências bancárias como pastelarias

  • fico chocado com a infantilidade dos deputados na Assembleia da República

  • reparo que os noticiários continuam cheios de telenovelas inconsequentes

  • abomino o tratamento por "Doutores" e "Engenheiros"

  • acho que temos todos nomes e apelidos a mais

  • me dizem repetidamente "Ah, estás muito bem em Singapura! Isto aqui está muito mal!"

  • concordo que os salários soam baixos e os recibos verdes escandalosos

  • ouço alguém reclamar da fuga aos impostos e a seguir justificar-se por os sonegar

  • já me tinha esquecido de como a auto-estima do país é baixa

  • fico surpreendido ao ver bandeiras portuguesas nas janelas

  • não entendo o que aconteceu no fenómeno social "Euro 2004"

  • fico a pensar se o futebol é a única coisa que une e motiva os portugueses

  • parece que se está a fumar menos em Portugal (ou os fumadores andam menos chatos/agressivos/invasivos)

  • o aeroporto finalmente é algo próximo de "livre de tabaco"

  • o meu estômago reclama da alimentação nos primeiros dias

  • mato saudades da sopa da minha mãe

  • como bacalhau dia sim, dia não

  • penso em pegar num garfo e numa colher para comer

  • sinto falta de comer arroz duas vezes por dia

  • me esqueço de pôr sal ao cozinhar arroz

  • reparo que em Portugal há uma pastelaria a cada 20 metros

  • fico fascinado com a variedade de pães e bolos nas padarias e pastelarias

  • passo uma vez por semana nos pastéis de Belém

  • compro castanhas assadas na rua

  • não é fácil comer vegetariano nos restaurantes

  • depois de uns dias sinto falta de uma água de coco

  • me descalço ao entrar em casa

  • preciso de fichas adaptadoras para ligar o computador à corrente

  • falo em dólares em vez de euros

  • ainda penso em contos

  • faço pagamentos com um cartão de crédito brasileiro

  • mudo para o BIG porque a Caixa cobra taxas de manutenção por ter lá poucos Euros

  • o banco em que tinha uma conta pequena esquecida mudou de nome (mas existe!)

  • não me lembro exactamente qual é a rua do Arsenal

  • visito museus, igrejas, parques e outros pontos "turísticos"

  • tiro fotografias

  • fico fascinado com os moínhos de energia eólica espalhados pelo país

  • acontece ficar surpreendido ao ouvir falar português

  • de vez em quando, a primeira palavra que me vem à cabeça é em inglês

  • já não sei se é facturação ou faturamento

  • hesito entre a esquerda e a direita ao cruzar-me com pessoas no passeio

  • corro numas das melhores trilhas quase urbanas do mundo: Estádio Nacional

  • percebo que já não existem provas de corrida grátis

  • vou de bicicleta para todo o lado

  • descubro satisfeitíssimo que agora há ciclovias em Lisboa

  • acho que os transportes públicos em Lisboa são muito bons

  • preciso consultar os percursos dos autocarros para decidir qual apanhar

  • ignoro o "7" à frente dos números de sempre dos autocarros

  • tenho que investigar como se pagam os transportes públicos de cada vez que volto

  • descubro que a linha vermelha do metro já vai até S. Sebastião

  • acho que Portugal tem auto-estradas a mais

  • vejo demasiados carros novos e caros (enquanto todos reclamam da "crise")

  • parece que toda a gente tem ou quer ter carro

  • piso excrementos de cão no passeio

  • passo o tempo a encontrar, do lado errado, ruas de sentido único

  • acho que Lisboa é uma cidade pequena

  • nem me passa pela cabeça que possa ser assaltado (nota: vindo de Singapura)

  • passo um mês preenchidíssimo com família e amigos, ao pequeno-almoço, almoço, lanche, jantar, "café", desporto, night - e não consigo estar com todos

  • tenho o reflexo de estender a mão para cumprimentar uma rapariga

  • reparo que entretanto passou um monte de tempo e há miúdos que já estão na faculdade, ou já a acabaram, ou já casaram e têm filhos

  • passo o tempo a encontrar velhos amigos na rua por acaso

  • me faltam ideias sobre onde combinar um jantar com amigos

  • já não sei onde moram os amigos

  • já não me lembro de quase nenhum número de telefone

  • o meu número de telemóvel foi desactivado por falta de uso

  • aprecio o frio do inverno

  • passo o inverno sem pôr um casaco

  • penso que Lisboa tem provavelmente o melhor tempo do globo

  • vou à praia (e entro na água!) no inverno

  • acho lindo correr ou pedalar à beira Tejo

  • adoro percorrer a Marginal até Cascais e reparar no percurso

  • reparo como Lisboa é uma cidade (cada vez mais) espectacular (e Coimbra também! e até o Porto! e muitos outros lugares)

  • fico com saudades ao partir!



Certamente, estas impressões não são nem exclusivas de emigras nem características de todos eles. Quais são as tuas?

10 comentários:

  1. Buli,

    Eu sinto exactamente o mesmo.
    E cada vez gosto mais, ao mesmo tempo que me sinto mais estrangeira em Portugal.

    Beijinhos,
    Teresa

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  2. Porque é que puseste uma fotografia do Porto?
    Se não tiveste consciência de que aquilo não era Lisboa, és ainda mais emigra do que pensavas!
    ehehe
    Joana

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  3. Não estás tão migra como os migras que só vêm para as "vacances", esses não diriam mal das auto-estradas...
    Também acho que Lisboa tem excelentes transportes públicos, não percebo porque é que o pessoal insiste no carro durante o dia.
    Bom texto meditativo!
    Saludos!

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  4. Que consonância engraçada!
    É das coisas que gostaria de te perguntar se te entrevistasse (outra vez! He, he).

    Quem vem de fora, olha sempre as coisas de forma diferente. Saboreia aquilo que para nós é banal. Detecta crescimento ou definhar naquilo que já é dia-a-dia de quem lida com as coisas todos os dias. É sempre muito enriquecedor. Obrigado!

    ABRAÇO!
    João.

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  5. é tudo bueda barato! Abrç. Feijoo

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  6. Em estreia no bulicenas... Não posso resistir em comentar, pois sinto o mesmo quando regresso a Lisboa - se bem que para mim é a um ritmo acelarado de 1 semana por ano que, entre o bacalhau, a cabeça de garoupa que o pai prepara e a feijoada de despedida - deixa pouco tempo para pastéis de belém e travesseiros de Sintra.
    Ainda bem que o Feijão ainda é vivo, pensava que já tinha desaparecido por algum etarra que insistiam em não pagar o aluguél... esta do aluguél tiveque pensar 10 vezes, jásó me sía em Inglês ou "brasileiro"...

    Abraço,

    Gil

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  7. Tens razão em tantas coisas:
    - desisto de ver notícias ao fim da 4ª quando já nada acrescenta a nada e se discutem temas que só interessam a quem os discute (e se calhar nem a eles)
    - temos uma baixa auto-estima e (pior!) o péssimo hábito de acharmos que em Portugal tudo é mau - temos um país fantástico! Perfeito? Não! Mas há algum que o seja? Parafraseando uma grande marca de leite: 'Se eu gostar de mim, quem não gostará?' - é assim que temos que olhar para o nosso país!
    - o tabaco - a vida melhorou significativamente desde que a lei entrou em vigor, mas começo a notar, lentamente, alguma regressão... vamos ver até que ponto!

    Gostei de ler. Quase para o fim descambaste.
    É que a frase "reparo como Lisboa é uma cidade (cada vez mais) espectacular (e Coimbra também! e até o Porto! e muitos outros lugares)" deixou-me um pouco enraivecida. Até o Porto???
    A tua salvação foi mesmo a fotografia da Ribeira do Porto... Uma mão lava a outra!

    Saudações Tripeiras!!!

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  8. Olha o Gil Maia Santos!!! hehehehe Ainda só fui preso 1 vez mas sem ficar com antecedentes! hahahahaha grande abraço

    J. Feijoo

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  9. Mas sabes... Acho que mesmo que regresses não perdes esses sentimentos.
    Já voltei há tanto tempo mas ainda partilho todos ou quase todos desses sentimentos...
    Há uma coisa que mudou: Fiquei mais exigente com este país pois SEI que somos CAPAZES de fazer muito e melhor...
    Bjs

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  10. As minhas sensações são muito semelhantes às tuas (tirando essas resultantes de overdose diária de arroz).
    Noto também em Portugal um certo medo da vida, uma falta de vontade de querer viver. Abdica-se de muito em troco de um quase nada mais seguro. Bem exemplificado no "não vou à rua com este tempo horrível, ainda me constipo".

    Rodrigo Gouveia

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