... encontram-se em Gangtok, estado de Sikkim, Índia (ali entre o Nepal, Butão e Tibete).
Viajantes solitários, cada um com as suas idiossincrasias. Decidiram fazer um trekking de uma semana em altitude (pelos 4.000 metros). Subir uma montanha por nenhuma razão em especial: porque ela está ali, pelo exercício físico, pela experiência espiritual? Cada um saberá a sua razão. Ou talvez não.
O inglês decidiu viajar por uns meses quando terminou a licenciatura em “International Development”. “Não, não é Desenvolvimento Económico – tentei focar-me mais nos aspectos culturais, antropológicos...” Acha que há algo de errado com o capitalismo. Tem andado pela Índia, mas dentro de um par de semanas vai para o Nepal, por mais dois ou três meses antes de regressar a casa e procurar “emprego”. Conheceu a israelita em Varanasi. Fuma, às vezes umas coisas esquisitas.
A americana dedica-se literalmente a apagar fogos: é bombeira nas florestas americanas. Circula de helicóptero por áreas de intensa natureza no Alasca, Montana, etc. Tem treino de primeiros socorros e noções e ferramentas (como o cantil purificador de água) de sobrevivência na natureza – provavelmente a pessoa mais útil do grupo nesta aventura. Como o trabalho só a ocupa no Verão, aproveita o Inverno para viajar. Começou há quatro meses no Egipto, circulou pelo Médio Oriente, e veio até à Índia. Conheceu a israelita no Rajasthan há várias semanas e encontraram-se mais ou menos por acaso de novo no Sikkim. Está feliz e ansiosa pelo regresso a casa dentro de duas semanas, e pelo sushi que vai poder comer! Costuma praticar meditação. Fuma marijuana (mas não tabaco) quando se aborrece.
A israelita concluiu o mestrado em Espiritualidades Hindu e Budista Indianas (ou algo parecido) e decidiu viajar durante um ano. Apesar de já ter viajado por seis meses na Índia quando terminou a licenciatura, decidiu voltar. Iniciou a viagem em Janeiro e vai ficar até Julho, quando o visto caduca. Não sabe ainda para onde irá a seguir: Sri Lanka? Birmânia? Vietname, Tailândia e arredores? Prefere viajar sozinha, independente, mais aberta aos outros, por isso acaba por estar sempre acompanhada pelas “pessoas maravilhosas que vai conhecendo”. Gosta de parar de vez em quando por mais tempo em alguns lugares, como fez por um mês em Varanasi (“às vezes precisamos de mais tempo para ‘entrar’ num lugar”). É professora de ioga, mas não é muito disciplinada na prática em viagem. Medita só de vez em quando. Não fuma, não bebe.
O italiano viaja há quatro meses e vai regressar a casa dentro de duas semanas. A tempo de voltar ao seu emprego sazonal, prestando serviços a iates numa marina no Adriático (no nordeste da bota), dando aulas de vela, velejando e apanhando sol... e poupando uns trocos para mais uma viagem no próximo Inverno. Começou a viagem em Katmandu, para onde voou com a sua bicicleta (comprada há uns anos numa viagem no norte da Tailândia). Pedalou pelo Nepal, tentou sem êxito entrar no Tibete, e depois veio para a Índia. É um especialista em viajar leve: ao sair de Itália a bagagem cumpria o limite de 27 kgs, incluindo 13 ou 14 kgs da bicicleta e roupa para todos os climas (que vai tirando de uma mochila digna do Sport Billy). Fala apaixonadamente das suas aventuras de bicicleta, diz que lembra cada 10 metros da estrada, mas da próxima vez quer viajar de moto (“de bicicleta é muito duro!”; e realmente no Sikkim é só montes e vales...). Como bom italiano, sente tudo com muita emoção, tem um humor bastante volátil. Pratica meditação e ioga todos os dias, com disciplina espartana: é o primeiro a acordar, pelas cinco da manhã, para ter um período de sossego. Apesar do estilo de vida limpo associado à meditação Vipassana que pratica, é adepto de marijuana.
O português está há seis meses na Índia, mas a trabalhar. Antes da Índia viveu três anos na América Latina. Acaba de se “reformar” de um emprego demasiado bem pago como consultor. Diz que poupou para viver bastantes anos sem salário e procura actividades que o apaixonem realmente, que não só lhe dêem satisfação nas interacções com as pessoas mas também tenham missões que o preencham. Não gosta de fazer viagens de lazer muito longas – prefere viajar para trabalhar em novos lugares. Veio para Sikkim por duas semanas “desintoxicar-se” do trabalho e depois vai para Singapura por uns meses, sem planos. Não fuma, não bebe. É desportista, viciado em corrida. Já experimentou meditar, mas o principal resultado foi descobrir uma técnica para adormecer rapidamente. Pensa fazer um curso de meditação agora que terá mais tempo livre.
O mundo é maravilhosamente aleatório. A vida cheia de boas surpresas. Cinco viajantes solitários, quatro deles de longo prazo. Dois trabalhadores sazonais, dois desempregados e um reformado. Dois meditadores e dois iniciantes. Três fumadores de drogas leves, dois limpos. Um praticante de ioga e uma professora. Boas energias, alegria, espiritualismo, abertura ao próximo, tolerância. Ao segundo dia pareciam amigos de longa data. No último dia construíram um monumento à amizade e despediram-se “até logo”.
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Um inglês, uma americana, uma israelita, um italiano e um português...
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