[Alguns leitores já estão talvez a entrar nesta bulicena com um pé atrás: “Que mau gosto escrever sobre estes assuntos! De que é que este tipo se lembrou desta vez??” Como sempre, quem não quiser ler - e for minimamente racional - não lerá!]
É curioso como quando alguém espirra é esperado, em muitas culturas, que as pessoas em volta lhe dêem uma palavra de apoio, desejando por exemplo saúde, longa vida ou bênçãos (p.ex., “saúde” ou “santinho” em português, “jesús” em espanhol, “bless you” em inglês). Por outro lado, quando alguém tosse não é esperado que se diga nada (ou talvez a mãe ou a avó mostre preocupação pela nossa saúde). Após um par de décadas de condicionamento, decidi há algum tempo deixar de dizer “santinho” ou “saúde”, para acabar com esta irracional discriminação (também poderia ter optado por desejar “saúde” em ambos os casos, mas então também deveria fazê-lo quando visse alguém coxear, ou com uma dor de cabeça ou algum outro incómodo – prefiro não ser tão consciente dos problemas alheios, não só para ter capacidade de me manter atento a outras coisas como para não ofender ninguém por desejar ou deixar de desejar “saúde”).
O arroto é considerado indelicado na maioria das sociedades que conheço. Consta que é uma forma de mostrar apreço pela comida em várias culturas asiáticas e africanas, mas sinceramente não recordo nenhum país em que tenha notado intenso recurso ao arroto nesse sentido (como admitido em outras ocasiões, é verdade que sou bastante distraído) . Fui educado para evitar arrotos espontâneos e nem sequer imaginar a possibilidade de ponderar a ideia de talvez, quem sabe, eventualmente, cometer a atrocidade de provocar um arroto (excepto em algum momento da minha infância em que estava com dores de barriga e a minha mãe generosamente me ensinou a provocar arrotos).
Há dias estava na silenciosa biblioteca do INSEAD, reputada instituição de ensino internacional, frequentada por jovens formados nas mais conceituadas universidades de todo o mundo, quando de repente se ouve um sonoro peido. As quatro pessoas ali perto olham para a quinta pessoa (não, não era eu – os meus condicionamentos não me permitem ser tão espalhafatoso), de onde tinha vindo o som e, quando parecia ter sido garantida audiência, ouve-se um novo sonoro e longo peido. Quatro pessoas reprimiram gargalhadas, a quinta continuou à procura dos seus livros, e a biblioteca voltou ao silêncio.
O espirro provoca tipicamente palavras positivas, de consideração, de apoio. Tosse, quando não ignorada, gera preocupação pela saúde de quem tosse. Arrotos e peidos costumam ser mal vistos, actos de manifesta falta de educação. Por quê esta discriminação entre diferentes fenómenos corporais? São fenómenos de diferente natureza mas com bastantes semelhanças. Todos implicam emissão de sons e expulsão de gases: ar com mais dióxido de carbono que o normal nos três primeiros, metano no último. A mistura dos peidos é geralmente mais fétida. Espirros e tosse (curiosamente os menos mal vistos) costumam expelir secreções potencialmente transmissoras de doenças. O metano, sendo altamente inflamável e causa de efeito estufa, poderia justificar a discriminação contra o peido por razões de segurança e/ou ambientais. Mas será que o espirro e a tosse não deveriam ser muito mais regulados, por questões de saúde pública (especialmente em épocas de pandemias de gripes asiáticas, aviárias, suínas, etc.)?
Como em muitas outros aspectos da vida, podemos escolher ver estes fenómenos corporais de forma positiva, negativa ou neutra. Não sou fã de maus cheiros alheios, mas parece-me justo que quem está com gases alivie o seu mal-estar (idealmente de forma discreta e sem incomodar o próximo, mas nem sempre isso é possível) e acho arrotos e peidos fenómenos bastante mais higiénicos e até divertidos do que espirros e tosse.
Por exemplo, diverti-me bastante com este vídeo do “Homem Peido” (apesar de provavelmente fraudulento, tendo em conta que o metano dos peidos é inflamável).
Melhores ainda sãos os dois vídeos seguintes, divertidos e educativos:
(ver também os restantes filmes em The Animals Save the Planet)
Mensagem: Comamos menos (ou nenhuma) carne, para diminuir a procura por vacas, e portanto o número de vacas no planeta, e consequentemente os peidos das vacas, o metano emitido e o efeito estufa provocado (extrapolando, comamos menos feijão e outros alimentos flatulentos, para reduzir as nossas próprias emissões de metano).
Mensagem: O hábito “educado” de pôr a mão à frente da boca ao tossir ou espirrar não é muito higiénico. Muito melhor seria se passássemos todos a tossir e espirrar para as mangas.
Engraçado como funcionam as convenções sociais, determinando de forma tirana e irracional (mas tantas vezes incontestada) o que é "de bom tom", de bom gosto, aceitável... Quem me dera que fumar estivesse classificado pelo menos a par do coitado do peido. A pressão sobre os fumadores tem aumentado significativamente ao longo dos anos (quem diria que o pesadelo de fazer 12 horas num avião com fumadores em volta nunca mais se repetiria?), mas é ainda insuficiente para eu ter pena deles. Estamos longe de se olhar para um fumador com o mesmo ar de censura com que se olha para alguém que sorve ruidosamente a sopa ou acaba de soltar um sonoro arroto ou peido.
heheheeh, que cômico o texto de hoje, fez-me logo lembrar um de meus irmãos em que a determinada altura minha sobrinha mais nova (tem 4 anos) dizia que o pai era o "joão peideiro" sempre mais divertido que o "joao espirradeiro".
ResponderExcluirPouco a pouco se mudarão mentalidades e hábitos que nos deixarão melhores,
obrigada pela partilha
beatriz
A propósito de tosse apenas, li há uns anos num centro de saúde que por questões de higiene devemos tossir para o ombro e não para as mãos porque as mãos mexem em tudo e os ombros não :)
ResponderExcluirBeijinhos
Daquilo que conheço o que posso dizer é que na sociedade chinesa o arroto é aceite, é frequente ouvir arrotos e outros sons como aqueles em que alguém desentope o nariz inspirando até em restaurantes, mesmo na mesa ao lado da que estamos a jantar :S!!
ResponderExcluirJá no Japão posso dizer que o arroto que perde o elevador (o peido) não é bem aceite, inclusivé existe nas casas de banho das senhoras um aparelho que imita o som da descarga do autoclismo para disfarçar os sons menos pudicos de quem está a aliviar a tripa. Os homens, pelos vistos não precisam dessas mariquices... :)
aproveito para contar a experiência mística da minha manhã de hoje; um jovem espadaúdo na mesma pista que eu (com este calor a piscina agora está sempre superlotada) de repente começa a espirrar para dentro da água; peito viril alçado, cá vai disto, as gotículas a sair das narinas numa velocidade perfurante, urgente, para também elas fazerem parte da enorme massa líquida, logo misturada e remisturada com tantos braços e pernas a bater… e eu que só agora aprendo a nadar, só eu é que paro a pensar nestas coisas… é quando o professor me grita que tenho de controlar melhor a respiração PARAR DE ENGOLIR TANTA ÁGUA, Patrícia! qualquer dia os teus colegas ficam sem meio para nadar…
ResponderExcluirHahahahahaha Mas quem era o que se peidou???? era occidental??? hahahahahha tava na boa de perna aberta a contaminar o ar? hahahahahha gostava de saber o fim da historia! hahahahah
ResponderExcluirDica: existem meios para evitar o ruido do famoso peido... mas nenhum até agora para evitar o possivel aroma desagradavel!!! hey! e porque nao inventar um desodorizante imediato anti-peido!? hahahaha
abraços
J. Feijoo